Publicado pela primeira vez em 1917, “Rondonia” é um clássico das ciências sociais brasileiras. Escrito pelo polivalente Edgard Roquette-Pinto, o livro é resultado da expedição que seu autor promoveu em 1912 à Serra do Norte, numa região dividida atualmente entre os estados de Mato Grosso e Rondônia – este último não existia ainda como unidade da Federação, o que só veio a ocorrer em 1943, com a criação do Território do Guaporé, que reunia terras de Mato Grosso e do Amazonas. Roquette-Pinto fez a viagem ao participar, a convite de Cândido Rondon, da Comissão de Linhas Telegráficas Estratégicas que percorreu aquelas vastidões do Norte do país, travando contato com diversas tribos indígenas. Esgotado há mais de 30 anos, o livro ganha agora a sua sétima edição, em lançamento conjunto da Academia Brasileira de Letras (ABL) e da Editora Fiocruz – que com a republicação lembram também os 50 anos de morte de Roquette-Pinto, que foi médico, antropólogo, radialista, escritor, cineasta e educador, entre outras atividades. E também membro da ABL, para a qual foi eleito em 1927.Esta nova edição, que traz fac-símile da primeira, permite descortinar um território que, décadas depois, já não é mais o mesmo. O país se desenvolveu, se urbanizou e se industrializou, a população cresceu bastante, viu parte significativa de suas florestas virem abaixo e a maioria de seus índios foram contatados e assimilados. Ao ler Rondonia, volta-se no tempo, a um tempo em que o Brasil estava para ser feito e com rincões para serem descobertos e mapeados. A expedição de quatro meses e 1.300 quilômetros da qual Roquette-Pinto participou, e que se tornou célebre pelo livro, inspirou outras viagens, como a feita pelo antropólogo francês Claude Lévi-Strauss na década de 30. O livro reflete as posições do cientista social brasileiro e o seu debruçar-se sobre um mundo distinto daquele vivido pelos acadêmicos da então capital da República – não à toa a obra é muitas vezes comparada a Os sertões, de Euclides da Cunha, outro livro que ajudou a revelar o país e cujo autor chamava Roquette-Pinto de “cientista e poeta”. O Brasil descobria o Brasil.Considerado pelo próprio autor como a transcrição de um caderno de campo, Rondonia elenca informações sobre plumária, cerâmica, cestas, instrumentos musicais e até parasitas coletados entre os povos indígenas pela expedição. Há comentários sobre doenças como leishmaniose, malária, sífilis, hanseníase e outras enfermidades encontradas, em especial entre os nambikwára e os paresí. Antropólogo e etnógrafo, revelador de um Brasil que começava se olhar mais profundamente, Roquette-Pinto relata na obra – recheada de fotos e ilustrações – costumes, tradições, danças, jóias, artefatos, armas e todo o dia a dia dos povos visitados, além de citar animais, insetos, peixes, aves, o clima e a geografia da Serra do Norte. Rondonia também traz um vocabulário de termos nambikwára e paresí.