Educandário Carlos Chagas é tombado provisoriamente
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Expectativa é de preservação da memória coletiva da política histórica de segregar os filhos de pessoas com hanseníase. Segue a luta pela reparação dos danos causados pelo estado brasileiro aos “filhos órfãos de pais vivos”
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O Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Cultural (COMPPAC), órgão da Prefeitura de Juiz de Fora, aprovou o tombamento provisório do prédio do Educandário Carlos Chagas, como início de um processo que vai, a partir de agora, analisar a possibilidade de tombamento definitivo da edificação.
A decisão foi tomada em reunião em 5 de julho, a partir de um pedido realizado pelo Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), pelo professor Marcos Olender, diretor do Centro de Conservação da Memória da UFJF, pelo Sindicato dos Arquitetos de Minas Gerais, e pelo Presidente do Núcleo de Juiz de Fora do Instituto dos Arquitetos do Brasil (IAB) Paulo Gawryszewsk. O tombamento provisório teve início a partir da notificação pela PJF à proprietária do imóvel, a Sociedade Eunice Weaver, nesta quarta-feira, 4 de agosto.
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O objetivo é o de preservar os prédios do Educandário como patrimônio sensível, garantindo a memória coletiva das vivências traumáticas e dolorosas vividas por gerações de crianças que cresceram no local. Isso porque o estado brasileiro foi o responsável direto pelo maior caso de alienação parental de nossa história, o qual passou justamente por instituições como o Educandário Carlos Chagas.
Até 1986, o Brasil mantinha pessoas com hanseníase em situação de internação compulsória em colônias, apesar da doença já ter tratamento desde o final da década de 1940. Os filhos desses internos, os quais chegavam a viver décadas nas colônias, eram separados de seus pais, muitas vezes no nascimento, e passavam a viver em educandários e preventórios. Assim, em razão de uma política de omissão do Estado em não promover e garantir a saúde de pacientes de hanseníase, houve danos enormes a estes núcleos familiares que foram separados e muitas vezes nem puderam se reencontrar. Vítimas de uma política higienista, eram também segregados do resto da sociedade, sofrendo com o preconceito.
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Reparação pelo estado enfrenta percalços
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Em reconhecimento ao crime cometido pelo poder público durante décadas, uma lei de 2007 estabeleceu uma indenização mensal vitalícia aos ex-internos compulsórios das colônias, mas não alcançou os seus filhos. Tramitam na Câmara Federal projetos de lei que buscam inclui-los, já há pelo menos 9 anos.
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Em Minas, em 2018, foi aprovada uma lei para indenizar os filhos separados. Mas o valor definido pela Secretaria de Estado da Saúde do governo Zema – 14 mil reais, em parcela única – causou revolta, pois não chega perto de reparar os danos.
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No último dia 14 de julho, a Câmara Municipal de Juiz de Fora aprovou uma representação que questiona ao governo estadual quais foram os critério adotados para definição deste valor. A proposta foi feita pela vereadora Cida (PT). Ela explica porque fez a proposta: “É um valor indigno, insuficiente. São pessoas que até hoje, décadas depois, sofrem pela separação das suas mães e por tudo que viveram. Elas eram impedidas de se locomover pela cidade, de frequentar o ensino regular. Recebemos muitos relatos de violências, abusos e agressões. Então, causa uma tristeza imensa e uma profunda indignação esse descaso com sua história de vida.”
No mesmo sentido, o deputado estadual Betão busca agendar na Assembleia Legislativa de Minas, através da Comissão de Direitos Humanos, uma audiência pública que trate da revisão da indenização.