“Fui avisado no Gabinete que na entrada do Palácio do Planalto estavam umas cem pessoas que queriam conversar com alguém do governo. Não estavam conseguindo entrar e não havia ninguém para recebê-los. Tanto insistiram que desci do terceiro andar para ver o que estava acontecendo e falar com eles. Eram hansenianos, coordenados pelo Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (MORHAN). Por razões mais ou menos óbvias, jamais tinham sido ouvidos, muito menos recebidos por alguém do governo. Me passou pela cabeça: “Esta é a nossa gente, os excluídos da civilização brasileira’. Comecei a ouvir suas histórias de vida: mães separadas de filhos, sem atendimento hospitalar, sem ajuda de qualquer espécie para sua sobrevivência. Vi que sozinho não ia dar conta da situação. Acomodei-os numa sala, voltei ao terceiro andar e fui falar com o presidente Lula: ‘Véio, você precisa receber essa gente’. Ele respondeu: ‘Mas como Gilbertinho, se vocês, como sempre, me arrumaram uma agenda maluca!’. Tanto falei que o convenci: ‘Tá bom, vou lá dar um abraço, uns cinco minutos’. Quando o presidente chegou onde eles estavam, foi emoção lado a lado. Lula viu aquela gente sem braços, toda deformada fisicamente, marcada pela vida. Algo se passou na cabeça e no coração dele. Começou a abraçar um por um e passou a ouvir suas histórias por uma hora e meia. Me lembrei de uma música conhecida pelos que são de igreja ou de pastorais: ‘Fica um pouco de perfume nas mãos que oferecem rosas’.E Lula determinou que em vinte dias eu providenciasse decreto, portaria, o que fosse, e desse um jeito de garantir uma renda para este povo eternamente abandonado. Se o governo tinha sempre dinheiro para tantos, por que não para eles? Ao final, Lula me agradeceu pela oportunidade de recebê-los e em pouco mais de vinte dias o apoio necessário, uma renda fixa foram garantidos.” Este relato emocionado, que emocionou a todos e todas, e me emocionou de novo agora quando escrevo, foi dado pelo ministro-chefe da Secretaria Geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, em julho, na retomada, dos Fóruns do Planalto, onde ele era o painelista e o tema “Participação social e Governo: Opção metodológica do Governo Dilma”. Gilberto Carvalho fez uma rememoração dos últimos trinta, quarenta anos: as greves e mobilizações no final dos anos setenta no ABC, quando surgiu Lula, em seguida, anos oitenta, os novos movimentos sociais, o movimento sindical combativo, as Diretas-Já, a mobilização da Constituinte. Daí surgiram governos progressistas, com políticas públicas com participação popular. A vitória de Lula para presidente é fruto desta história. E seu governo não poderia ser diferente desta história. Era preciso abrir o Palácio para que todos e todas nele pudessem entrar, serem recebidos, ouvidos e atendidos. E criou-se uma consciência forte no meio do povo: ‘Ele, Lula, esse sujeito é um dos nossos’. Por isso, Lula começou a viajar pelo país e nos palanques e atos públicos sempre há alguém do povo, alguém dos movimentos sociais ao lado das autoridades, do governador, dos senadores e deputados, dos empresários. Coisa inédita na história brasileira. Houve a retomada da realização de Conferências, o apoio aos Conselhos, o apoio à mobilização social, com a criação, por exemplo, da Rede de Educação Cidadã, diretamente ligada ao Gabinete do Presidente da República, as políticas voltadas aos mais pobres e aos trabalhadores. Continua Gilberto Carvalho: “Começa o governo da presidenta Dilma. Alguns dizem: ‘Tudo isso foi bonito, é a cara do Lula. Mas Dilma é mais fechada, tem outra formação e história’. Mas quando ela me chamou para seu governo, disse: ‘Gilberto, preciso de você para ser uma espécie de grilo falante, e trazer os anseios da sociedade. Quero ouvir e falar com os movimentos sociais’. A presidenta Dilma tem consciência em profundidade da necessidade de um governo de participação.” Por isso, o tema do Fórum do Planalto refere-se à participação social como opção metodológica do governo federal. A Secretaria Geral da Presidência da República deverá fazer a mediação entre o governo federal e a sociedade, envolvendo dois aspectos principais: a atuação da Secretaria Geral deverá ser pautada pela transversalidade, envolvendo os outros órgãos de governo nas demandas trazidas pela sociedade; e terá um papel de aprofundar a democracia mediante a construção de formas de participação da sociedade no governo. Nas palavras do ministro Gilberto Carvalho, ‘a Secretaria Geral não deve ser apenas portadora de demandas. Deve trazer a participação social para dentro do governo, deve torná-la método de governo’. Todos os setores sociais têm sido convidados a falar com o governo Dilma, muitos com a própria presidenta. Há um esforço de vitalizar Conselhos e Conferências. O Plano Plurianual (PPA)- 2012-2015 foi discutido por um Fórum Inter-Conselhos recém-criado. A Rede de Educação cidadã continua, agora na Secretaria Geral. A presidenta Dilma, entre outros teres Fóruns, criou o Fórum Direitos e Cidadania, sob responsabilidade da Secretaria Geral, com participação da Secretaria dos Direitos Humanos, da Secretaria das Mulheres, da Secretaria de Promoção da Igualdade Racial, do Ministério da Cultura, entre outros ministérios. Nenhum governo pode ou deve ter medo do diálogo com a sociedade, de sentar à mesa para conversar sobre qualquer assunto com quer que seja, mesmo em meio a eventuais contradições e limites do governo, fruto da institucionalidade, das relações políticas e da correlação de forças. A mobilização social, a participação popular e a conscientização são elementos e momentos fundantes de governos com raiz popular, de uma sociedade democrática, da construção de um país com justiça e igualdade social, de uma Nação com soberania.
Selvino Heck
Assessor Especial da Secretaria Geral da Presidência da República
Em cinco de agosto de dois mil e onze