SUS não opera vítimas da hanseníase

Hanseníase é página virada para Fabrício Gonçalves Gomes de apenas 11 anos. A seqüela da doença, não. Sua mão direita está parcialmente atrofiada, perdeu tecido muscular e parte do dedo indicador, e todos os dedos se movimentam com dificuldade. Isso acontece porque Mato Grosso não tem hospital credenciado para cirurgia de lesões causadas pelo bacilo dessa doença. Fabrício entrou numa fila de espera que não anda. Juntamente com ele, adultos, outras crianças e adolescentes definham em silêncio diante da impotência do Estado. Em Nossa Senhora do Livramento o agricultor Fortunato Felismino de Oliveira, 36, enfrenta problema semelhante ao de Fabrício. Oliveira necessitava de duas cirurgias. Conseguiu uma no Hospital São Julião, em Campo Grande (MS) e mesmo assim permanece impossibilitado de trabalhar: a mão direita perdeu sensibilidade e o pé esquerdo está parcialmente mutilado – é o que se chama de “pé caído”. Pelo menos cinco ex-portadores da hanseníase que esperam por cirurgia falaram de seus problemas, mas sob condição de anonimato. Isso, porque a doença é estigmatizada desde tempos imemoriais. Mato Grosso é hiperendêmico em hanseníase e seus números são assustadores, mas não há um hospital sequer credenciado nos 141 municípios mato-grossenses pelo Sistema Único de Saúde (SUS) para cirurgias de lesões causadas por essa doença milenar, que no passado se chamava lepra. Pior: a Secretaria de Estado de Saúde admite que desde o começo do ano passado, nenhum especialista presta esse tipo de atendimento na rede pública. O coordenador Estadual de Hanseníase, Cícero Fraga de Melo, não esconde que desde o ano passado, nenhum paciente com sequela da hanseníase foi operado em Mato Grosso. Justifica que o único médico que prestava esse tipo de atendimento deixou de fazê-lo por discordar do valor pago pelo Estado. “Esse profissional – acrescentou – pediu reajuste no segundo semestre de 2008 e até agora o secretário de Saúde, Agostinho Moro, avalia essa proposta”. Enquanto Moro se debruça sobre a proposta do médico, a fila da espera por cirurgia cresce. Estima-se que pelo menos 150 ex-hansenianos necessitem de algum ato cirúrgico. Isso significa que mesmo Mato Grosso recontratando o profissional citado por Melo, a situação não será humanizada, pela limitada capacidade de atendimento. O ideal para zerar a demanda por cirurgia seria a reestruturação da equipe de cirurgiões especializados, que durante alguns anos atendeu no Centro Estadual de Referência de Média e Alta Complexidade (Cermac), em Cuiabá. Esse é o entendimento do representante em Mato Grosso e Amazonas da ONG Dahw – sigla em alemão da Associação Alemã de Assistência aos Hansenianos e Tuberculosos – Manfred Göbel, que atua na região há 30 anos. Göbel observa que em 2002 começou o desmantelamento da equipe de cirurgiões do Cermac e que paralelamente a isso o número de vítimas das sequelas da hanseníase aumentou. “Tentei várias vezes demonstrar Isso à Secretaria de Saúde, mas foi tudo em vão”, lamenta. Matéria de Eduardo Gomes, para Diário de Cuiabá

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