“O Dia Mundial da Luta contra a Hanseníase”
José Souza de Menezes, 58, relata que tinha dois anos de idade quando a mãe, Helena Souza de Menezes, contraiu a hanseníase. A família morava na região do Purus e foi trazida para Rio Branco mesmo contra a vontade. “Não lembro quanto tempo fiquei internado no Educandário Santa Margarida, que na época era chamado ‘Preventório’. Minha mãe foi separada de mim e levada para a Casa de Acolhida Souza Araújo, conhecida como ‘Leprosário’”, destaca. Aos 17 anos José descobriu que também tinha a doença e foi encaminhado à colônia, onde voltou a ter contato com a mãe. Na época Helena já estava muito debilitada e morreu pouco tempo depois. “Perdi a vontade de viver. Pensei muitas vezes em me matar, pois para mim não havia mais nenhuma esperança fora dos portões da colônia”, rememora. Ele não lembra quanto tempo ficou internado no hospital e diz que ao sair da colônia foi levado para a casa de parentes, onde era isolado das demais crianças e fazia as refeições sentado no chão dos cantos escondidos da casa. Paulo Bernardo dos Santos, hoje com 62 anos, descobriu que tinha a doença aos oito anos de idade e também morava na região do Purus. Era filho de pais separados, morou com a mãe até os três anos e depois passou para a companhia do pai, que morreu quando ele completara dez anos, vindo à mãe também a morrer pouco tempo depois. “Fiquei internado na colônia até os 30 anos de idade. Passei 20 anos naquele lugar, onde conheci minha mulher, Alcidália Pereira de Mendonça [já falecida] e constituí uma família que foi separada de nós”, acentua. O primeiro filho nascido da união de Paulo e Alcidália foi Manoel Mendonça dos Santos, que hoje tem 30 anos. “Minha esposa nem chegou a tocar no bebê ou dar a primeira mamada. Os recém-nascidos eram levados imediatamente ao Preventório antes mesmo de tomar o primeiro banho. Eles só cortavam o umbigo do neném, colocavam-no numa cesta e mandavam para o abrigo”, realça. Paulo diz que Manoel, o primeiro dos seus 12 filhos, tem problemas mentais por causa de maus-tratos sofridos na infância. Parte dos maus-tratos da época, segundo ele, está exposta em uma marca de queimadura que o rapaz traz no rosto, provocada por uma colega de quarto que ateou fogo no colchão e jogou nele. A segunda filha de Paulo, Maria da Glória Mendonça dos Santos, também foi enviada da colônia para o Preventório quando era recém-nascida. “Ficamos sabendo depois que ela tinha morrido. Nunca vimos seu corpo ou sepultura. Desconfio que esteja viva, porque esse tipo de história era muito contado na época, quando uma família se interessava em adotar a criança e não queria que os pais soubessem o paradeiro”, expõe. Bebês transportados em cestasPaulo Bernardo dos Santos lembra que era ele próprio que carregava os filhos da colônia até o Preventório. “Eu levava os meus filhos e os de outros pais que viviam na colônia. Os bebês eram transportados em cestas e muitos não resistiam ao percurso, morrendo no caminho”, destaca. Segundo Paulo, todo o percurso era acompanhado de perto por um dos administradores da colônia, para garantir que o pai não se desviaria do caminho nem fugiria depois. “Esse foi o caminho mais longo e mais amargo que eu tenho lembrança de ter percorrido na minha vida”, desabafa. Quem fazia esse transporte, segundo ele, tentava alentar o próprio coração com o pensamento de que talvez a separação fosse o melhor para a saúde da criança. Pacientes eram caçados e capturados como animaisA maior parte dos pacientes dos hospitais-colônia foi capturada ainda na juventude. Foram separados de suas famílias de forma violenta – caçados e laçados como animais – e internados compulsoriamente. Muitos