Separados devido à doença da mãe, irmãos se reencontram após 40 anos

Separados devido à doença da mãe, irmãos se reencontram após 40 anos

01/09/2015 13h44 – Atualizado em 01/09/2015 14h22

Separados devido à doença da mãe, irmãos se reencontram após 40 anos

Irmãos se separaram depois que a mãe foi diagnosticada com hanseniáse.
Cleomar Freire, de 60 anos, vive em Rio Branco e José Vieira, de 53, em RO.

 Caio Fulgêncio

Do G1 AC

Irmãos se separaram depois que a mãe foi diagnosticada com hanseníase e internada compulsoriamente (Foto: Caio Fulgêncio/G1)Irmãos se separaram depois que a mãe foi diagnosticada com hanseníase e internada compulsoriamente (Foto: Caio Fulgêncio/G1)

Separados há mais de 40 anos após a mãe ser diagnosticada com hanseníase, os irmãos Cleomar Freire, de 60 anos, e José Vieira, de 53, se reencontraram nesta terça-feira (1), durante o aniversário de 33 anos do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), em Rio Branco. Cleomar mora na capital acreana e José, desde criança, reside em Porto Velho (RO). A mãe, Maria Teresa de Jesus, de 75 anos, também pôde acompanhar o reencontro.

“Quando minha mãe adoeceu, meu avô a trouxe para fazer exames em Rio Branco, foi constatada a hanseníase e ela já ficou internada. Eu e meus dois irmãos ficamos no seringal com meu avô, mas ele foi preso, e ficamos com tios, sofrendo”, relembra.De acordo com Cleomar, o mais velho de três irmãos, quando a mãe adoeceu, a família morava no Seringal Bom destino, próximo ao município de Porto Acre, distante 78 km de Rio Branco. As datas são incertas, mas os irmãos eram ainda crianças. Com o diagnóstico, Maria Teresa foi separada dos três filhos e internada compulsoriamente, em Rio Branco.

Com o avô preso, os três irmãos foram entregues a um educandário também na capital acreana. O ano era 1959. Freire diz que ficou no local apenas dois meses, mas os irmãos permaneceram. Ele retornou para o seringal onde a família morava para trabalhar.”Meu avô saiu da prisão e me tirou para ir trabalhar e meus outros dois irmãos ficaram internados”, diz.

Tempos depois, Cleomar diz que os irmãos mais novos foram também retirados do orfanato e voltaram para o seringal para o trabalho de corte de seringa – árvore da qual se retira o látex para a produção de borracha. “Depois que José saiu, nós ficamos no seringal, fomos cortar seringa. Quando ele tinha uns 13 anos, minha mãe o levou para Porto Velho e ninguém se viu mais e eu tinha uns 20 anos”, conta. Na época, Maria Tereza foi para a capital rondoniense continuar o tratamento.

Irmãos Cleomar Freire e José Vieira ao lado da mãe Maria Tereza, de 75 anos (Foto: Caio Fulgêncio/G1)Irmãos Cleomar Freire e José Vieira ao lado da mãe Maria Tereza, de 75 anos (Foto: Caio Fulgêncio/G1)

José Vieira, então, viveu durante todo o período em Porto Velho e, mesmo após o retorno da mãe para a Acre, não conseguia contato com o irmão. Ele diz que visitava Maria Tereza pelo menos uma vez por ano, mas nunca conseguiu o endereço correto de Cleomar. “É uma ‘doideira’ na minha cabeça, eu sabia que tinha um irmão que não via há muito tempo, mas nunca tinha a esperança de encontrar. Sempre eu vinha visitar minha mãe. Só esse meu irmão que não tinha o endereço”, fala.

Quatro décadas depois, o reencontro dos dois irmãos, uma vez que o terceiro já é falecido. “É bom demais encontrar meu irmão, ficamos muito felizes. Eu pensava que ele era um pouco mais alto do que eu, porque quando saiu ele era pequeno. Só achava que ele era mais alto do que eu”, brinca Cleomar.

Para José, o encontro – organizado pelo Morhan – foi uma verdadeira benção de Deus por reunir novamente toda a família. “Só tenho a agradecer por um encontro desse. Isso é maravilhoso, graças a Deus, esse povo entrou no meu caminho. Temos muita conversa para colocar em dia. Já pensou, separados ainda criança e agora rever de novo?”, diz.

Emocionada, a mãe dos dois, Maria Tereza, comemora os dois filhos unidos novamente. “Estou com alegria dentro do meu  coração. Toda a vida rezei por isso. Quando me disseram que meu filho estaria aqui, eu tomei um susto. Parece que saiu toda a sujeira do meu coração. Deus é bom pai para nós todos”, ressalta.

Irmãos Cleomar Freire e José Vieira se reencontram depois de 40 anos  (Foto: Caio Fulgêncio/G1)Irmãos Cleomar Freire e José Vieira se reencontram depois de 40 anos (Foto: Caio Fulgêncio/G1)

Morhan completa 33 anos no Acre
O encontro foi organizado pelo Morhan, que está completando 33 anos no estado. “Não é fácil unir esses laços, mas, com a ajuda de parceiros, fomos em busca. Hoje, ficamos muito felizes com a família do Cleomar e José que está podendo se abraçar. Queremos que o governo federal reconheça o crime que cometeu em separar essas pessoas, tirando-as dos laços familiares”, afirma o coordenador do movimento, Elson Dias.

Dias lembra que o movimento foi fundado por Francisco Oliveira Nunes, conhecido como Bacurau. Atualmente, o serviço conta com 20 voluntários e se dedica ao combate à doença ao preconceito. “Estamos comemorando 33 anos de luta pela vida. Um movimento que surgiu pela necessidade combater o preconceito, reintegrar as pessoas que foram separadas da sociedade levadas para colônias”, diz.

Morhan completa 33 anos no Acre (Foto: Caio Fulgêncio/G1)Morhan completa 33 anos no Acre
(Foto: Caio Fulgêncio/G1)

Ainda de acordo com o coordenador, na quarta-feira (2), a comemoração ocorre em Cruzeiro do Sul. Já na quinta-feira (3), está marcada uma sessão na Assembleia Legislativa do Acre (Aleac), onde será lançada oficialmente a Semana Estadual de Combate à Hanseníase.

“Durante essa semana, vamos ter atividades em Rio Branco e Cruzeiro do Sul, onde tiveram duas colônias. Estamos fazendo o lançamento da Semana Estadual de Combate à Hanseníase, exigindo mais do poder público no combate à doença”, finaliza.

 

 

Fonte: G1