Os irmãos Wesley Evandro e Tayna Rayane, de 7 e 10 anos, mal piscavam os olhos. Ouviam com atenção o cantor Belchior, o mais novo voluntário do Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan). Sob o sol quente do Alto da Bela Vista (bairro do Coqueiral, no Recife), receberam a lição do famoso que, antes de abraçar a arte, estudou medicina. Belchior recomendava atenção para qualquer mancha estranha no corpo de algum parente e frisava o papel das crianças na brigada contra a hanseníase. Ele e as crianças participaram na última terça-feira (16) do lançamento da campanha “Dia do Espelho”, que consiste em levar às residências espelhos de um metro de altura para incentivar as pessoas a observar os próprios corpos em busca de possíveis manchas na pele. Os espelhos servirão também para o auto-exame de câncer de mama e da boca. Belchior, a Prefeitura do Recife e integrantes do Morhan entregaram os espelhos a agentes de saúde, que os deixarão temporariamente nas residências. Idealizador do projeto, o médico Isaías de Souza Filho pensou no espelho como alternativa para driblar a resistência da população em mostrar o corpo para os agentes de saúde. Bairro com cerca de nove mil habitantes, o Coqueiral teve 9 casos novos de hanseníase em 2008, contra 7 no ano anterior. Os chamados casos novos indicam a existência de um paciente transmissor, ainda sem tratamento. A média tida como aceitável é de um caso a cada 10 mil pessoas.”A palavra de um artista tem uma repercussão muito maior porque ele é capaz de influenciar e passar uma boa mensagem para a população”, acredita a secretária de Saúde do Recife, Tereza Campos, que participou do evento. O novo instrumento de trabalho parecia empolgar as agentes de saúde do Alto da Boa Vista. “Esses espelhos vão nos ajudar muito, tenho certeza. Tanto nas visitas domiciliares quanto nas palestras que fazemos”, comentou a agente Rosilene Padre, de 38 anos. No lançamento da campanha, Belchior cobrou mais empenho dos governos na erradicação da doença e no combate ao preconceito contra os doentes. A hanseníase continua viva e ameaça as novas gerações do país, conforme mostrou o Diario de Pernambuco em caderno especial em 18 de maio passado. De autoria das repórteres Silvia Bessa e Marcionila Teixeira, a reportagem conquistou semana passada o mais tradicional prêmio do jornalismo brasileiro, o Esso, como melhor trabalho do Norte/Nordeste. A hanseníase é uma doença que já tem tratamento e cura, mas continua vítima de estigma do passado – fruto de uma política de isolamento dos pacientes em colônias, que vigorou até os anos 1980. Clique aqui para assistir o vídeo da reportagem. Fonte: Diário de Pernambuco