Nesta sexta-feira, 07/12, as pessoas separadas de seus familiares durante o isolamento compulsório de pacientes com hanseníase – vigente no país até a década de 1980 – estarão reunidas no município de Marituba, no Pará. O evento marca a entrega de resultados de exames de DNA realizados pelo Programa Reencontros, idealizado pelo Movimento de Reintegração das Pessoas Atingidas pela Hanseníase (Morhan), com o objetivo de identificar pais, filhos e irmãos que sofreram alienação parental durante o período. A entrega será às 17 horas, na Casa da Seresta (Rua Souza Araújo, nº 30, Bairro Dom Aristides, Marituba, Pará). Dois pares de irmãos receberão o resultado dos exames de DNA que podem comprovar o parentesco entre eles. “O Programa Reencontros é inspirado na história das Avós da Praça de Maio, que também utilizaram exames genéticos para reencontrar seus netos, filhos de cidadãos desaparecidos durante a ditadura militar na Argentina”, conta o conselheiro nacional de saúde Artur Custódio, coordenador nacional do Morhan. Para a experiência brasileira, o Morhan realiza o mapeamento histórico familiar e os documentos de pessoas que já identificaram prováveis familiares, para que o exame genético comprove os laços de parentesco. A geneticista Flávia Biondi, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), que integra o Inagemp, explica o exame de DNA será feito a partir de amostras de saliva. “A coleta de saliva não é invasiva, como a de sangue, e por isso facilita o manejo clínico. Para contemplar todo o território nacional, o Programa Reencontros utilizará um recipiente capaz de preservar a amostra clínica por tempo suficiente para o transporte até o Hospital das Clínicas de Porto Alegre, onde análises moleculares serão realizadas, em um processo que pode levar até quinze dias”, esclarece a especialista que estará presente no encontro do Pará. O Programa Reencontros é resultado de uma parceria com o Instituto Nacional de Genética Médica Populacional (Inagemp) e a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. Força tarefa para garantia de direitos – Uma força tarefa composta por representantes do governo e do Morhan foi criada para viabilizar a extensão das medidas reparatórias concedidas às pessoas que foram segregadas nas antigas colônias também aos seus filhos. “O Brasil foi o segundo país do mundo a indenizar as pessoas submetidas ao isolamento compulsório, seguindo a experiência japonesa. Agora, poderá ser o primeiro a estender as medidas reparatórias aos filhos que foram separados dos pais durante a vigência desta política, que configura um grave crime de Estado”, afirma o coordenador nacional do Morhan. O representante do Morhan na força tarefa, Edymilson Picanço, que também foi vitima da alienação promovida pelo governo na época, estará presente a reunião. “O Grupo de Trabalho Interministerial levará os caminhos da reparação à presidenta Dilma Rousseff. A proposta é a indenização dos filhos que foram separados dos pais nos moldes da lei federal nº 11.520, de 18 de setembro de 2007, que concede pensão especial às pessoas submetidas ao isolamento compulsório”, esclarece Artur Custódio, se referindo à lei que garante aos cidadãos que foram segregados nas antigas colônias pensão vitalícia de R$ 750, fornecimento de próteses, realização de intervenções cirúrgicas e assistência à saúde por meio do Sistema Único de Saúde (SUS). Entenda o isolamento compulsório – No Brasil, até a década de 1980, a lei federal nº 610 de 13 de janeiro de 1949 recomendava o isolamento compulsório dos pacientes com hanseníase, que eram então mantidos em colônias. A mesma lei ordenava a entrega dos bebês de pais com hanseníase à adoção, o que levou à separação de milhares de famílias. Esta situação perdurou até 1986, quando os antigos hospitais colônias – então chamados leprosários – foram transformados em hospitais gerais. “Os muros foram derrubados, os portões abertos, mas a luta pelo reencontro destas famílias ainda continua”, revela Artur. Envolvido na promoção da saúde e da cidadania de pacientes com hanseníase e seus familiares, o Morhan desenvolve um extenso trabalho na busca de reunir as famílias separadas pelo isolamento compulsório dos pacientes com hanseníase e de reparar os danos causados por esta política, vigente no país até a década de 1980. Um trabalho importante realizado nesta área é a mobilização para a aprovação, pela presidente Dilma Rousseff, de legislação que garanta a indenização dos filhos separados de seus pais, conforme recomendação da Comissão de Direitos Humanos das Nações Unidas.Hoje, a lei federal nº 11.520 de 18 de setembro de 2007 dispõe sobre a concessão de pensão especial às pessoas atingidas pela hanseníase que foram submetidas ao isolamento compulsório – porém, o benefício não se estende aos seus filhos. “Desde 2010, o Conselho Nacional de Saúde recomenda a aprovação de uma medida provisória que estenda as ações de reparação e indenização aos filhos separados dos pais durante a fase do isolamento compulsório de pacientes com hanseníase”, defende o coordenador nacional do Morhan. Neste contexto, o movimento social, apoiado por artistas como Ney Matogrosso, Elke Maravilha e instâncias como a Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, vem promovendo audiências públicas em todos os Estados brasileiros, com o objetivo de fortalecer o debate sobre o tema e a reivindicação da medida provisória que estenda o benefício aos filhos das pessoas submetidas ao isolamento compulsório.