Fator de vulnerabilidade

Fator de vulnerabilidade

Agora que o Projeto Genoma Humano mapeou mais de 90{f78083fa18024c958024f85e169f297940a7362b50e775d9fb9c3e6c3fd77208} dos genes do homem, o desafio é descobrir alterações nesses genes que possam ser causadoras de doenças complexas. “Mas é importante destacar que não existe um gene do câncer de mama ou da hanseníase, como tem sido propagado nos últimos anos. São as variantes de um determinado gene que conferem suscetibilidade a uma doença”, disse o biólogo Milton Ozório Moraes, do Laboratório de Hanseníase do Instituto Oswaldo Cruz (IOC), da Fundação Oswaldo Cruz. Ao lado de pesquisadores do Canadá, da França, da Índia, do Vietnã e do Brasil, Moraes acaba de identificar uma possível causa da suscetibilidade à hanseníase. Trata-se de uma alteração na linfotoxina-alfa (LTa), gene que regula a resposta imune e é comum a todo ser humano. O estudo foi publicado pela revista Nature Genetics. O grupo brasileiro vem, há dez anos, investigando genes envolvidos na resposta imune a agentes infecciosos como o bacilo de Hansen, microrganismo que causa a hanseníase. Em 2003, em colaboração com pesquisadores da Universidade McGill, no Canadá, a equipe realizou análises moleculares de familiares de portadores da doença, que pelo contato com os pacientes poderiam estar sujeitos a contrair a infecção. Por meio de uma estratégia conhecida como “zoom molecular”, os cientistas localizaram uma pequena alteração no gene LTa entre os doentes estudados. Como os demais genes do DNA humano, a LTa possui dois alelos – A e C, onde a presença do alelo A indica a suscetibilidade à doença. “O que estamos mostrando é que uma variação nesse gene pode alterar a função dessa proteína. O indivíduo que carrega essa variação deve produzir menos linfotoxina e ter uma resposta imune mais fraca – e maior possibilidade de desencadear a hanseníase. Ele estaria suscetível à doença porque tem uma resposta imune ineficiente, que não consegue controlar a proliferação do bacilo de Hansen. Quando uma pessoa é infectada por uma bactéria, as células são ativadas para eliminá-la”, disse Moraes. No total, foram avaliadas cerca de 2 mil pessoas (infectadas e saudáveis), entre brasileiros, indianos e vietnamitas. De acordo com a pesquisa, os indivíduos suscetíveis, que carregam essa alteração genética, não teriam condições de fazer a eliminação e de evitar a proliferação do bacilo nas células. O pesquisador do IOC ressalva, no entanto, que nem todo aquele que tem essa alteração desencadeia a doença necessariamente. “A hanseníase é uma doença que não pode ser atribuída somente a fatores genéticos. Uma pessoa, mesmo apresentando a variante genética que identificamos, se não tiver contato com a bactéria pode não desenvolver a doença”, disse. “No caso da hanseníase, embora estudos da década de 1970 já mostrassem a existência de um componente de hereditariedade, este também não é o único fator. É a contribuição conjunta de genes e o ambiente que favorecem o desenvolvimento da doença. Há fatores ambientais envolvidos, assim como o status de vacinação e a idade. Um dado importante de nosso estudo foi ver que o efeito desse gene é mais forte em crianças de até 15 anos”, afirmou. Segundo Moraes, o Brasil apresenta baixo índice de crianças com hanseníase em relação aos outros países envolvidos no projeto. “As crianças aqui são menos diagnosticadas para a doença. Muitas vezes a patologia pode passar despercebida. Mas esse número está crescendo entre crianças e adolescentes, talvez devido à melhora da notificação. O problema é que a bactéria causadora da hanseníase se divide lentamente, fazendo com que a doença se manifeste tardiamente.” Para o pesquisador, a principal descoberta do trabalho foi constatar que uma mesma alteração no gene contribui para a suscetibilidade à doença em diferentes populações,