Aos 15 anos, Waldomiro Araújo Miranda foi proibido de freqüentar a escola. Era a primeira vez que perdia um direito. Não seria a única. Aos 64 anos, vítima de hanseníase, vive no Hospital de Dermatologia Sanitária do Paraná, em Piraquara. A instituição recebeu um nome politicamente correto nos anos 80, quando a lepra passou a ser chamada de hanseníase e os pacientes deixaram de ser condenados à reclusão em colônias. Os esforços para minimizar o estigma em torno da doença, no entanto, não foram suficientes. Foi-se o tempo em que as pessoas eram laçadas nas ruas e confinadas em leprosários. Mas o isolamento social não se rompeu. Waldomiro é livre para morar onde quiser, mas prefere continuar vivendo na ex-colônia, junto com os outros pacientes. Diz que é feliz. Curado da doença, exibe seqüelas que assustam os desavisados. Tem os pés e as mãos em forma de garra. Precisa de um triciclo para se locomover. Não arranjaria emprego facilmente. Trabalha na própria colônia, fazendo pinturas em gesso. Felizmente, não foi abandonado pela família como acontece com muitos dos pacientes. Mas se sente mais confortável dentro dos limites do hospital. “É como uma família”, diz. É compreensível que pessoas como Waldomiro não queiram se mudar de uma ex-colônia, diz Antônio Cleudo Lopes, diretor do Hospital de Dermatologia Sanitária do Paraná. “Eles têm atendimento médico e vínculos com quem passou pelo mesmo problema. Apesar de não representarem perigo algum para a sociedade, as seqüelas dificultam a vida lá fora”, afirma. Perseguidos desde os tempos bíblicos, ainda hoje os pacientes são vítimas de preconceito. Muita gente não sabe que a doença só é transmitida quando o portador do bacilo de Hansen ainda não recebeu os remédios. COMUNIDADEPacientes da ex-colônia de Piraquara que decidiram continuar na instituição. Da esquerda para a direita, Leo, Elias, Paulo (sentado, ao centro) e Adão Na semana passada, uma contribuição na luta contra a ignorância que cerca a doença foi apresentada no Congresso da Sociedade Brasileira de Dermatologia, em Curitiba. Pesquisadores da Pontifícia Universidade Católica do Paraná e da Universidade McGill, do Canadá, identificaram um gene no cromossomo 6 que torna o organismo imune ao bacilo de Hansen. A descoberta prova que para um indivíduo se infectar não basta ser exposto à bactéria, transmitida pela respiração durante contato prolongado com um doente. É preciso também ser suscetível à doença. Estima-se que apenas 3{79cc7c547c82c26ee96fc2fefb6afbdee3eadc00daef34e76e11ca91d3e5e06b} a 10{79cc7c547c82c26ee96fc2fefb6afbdee3eadc00daef34e76e11ca91d3e5e06b} da população mundial seja. “Isso explica por que médicos que durante anos trataram desses pacientes nunca foram contaminados”, afirma o cientista Marcelo Mira, da PUC do Paraná. A equipe procura novos genes envolvidos na doença. Até agora, mil pessoas foram estudadas. Na primeira fase da pesquisa, os voluntários eram do Vietnã. Depois, a pesquisa foi repetida no Brasil. A variação genética foi encontrada nas duas populações, o que demonstra que não se trata de um traço exclusivo de uma única etnia. Essa linha de pesquisa pode levar a testes genéticos simples, que identifiquem pessoas suscetíveis antes que elas adoeçam. A hanseníase é uma vergonha para o Brasil. O país está entre os seis únicos do mundo que não alcançaram a meta de eliminação da doença, segundo relatório da Organização Mundial da Saúde (OMS) divulgado em agosto. Em 2005, o Brasil teve 20 casos novos para cada 100 mil habitantes. A meta da OMS é a metade disso. No ranking dos piores do mundo,